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ARTIGO/ENTREVISTA: “Um Drink com… os Arctic Monkeys”

Skip Matheny — atualmente compositor da banda Roman Candle e ex-garçom de uma comunidade de aposentadoria — foi visto com Alex Turner e Matt Helders, do Arctic Monkeys, antes de seu show em Chicago, Illinois, no outono passado.
Exclusividade online: esta é a transcrição completa do texto, que inclui diversas perguntas e respostas não disponíveis na primeira edição dessa entrevista.

Créditos: Timshel Matheny.

Créditos: Timshel Matheny.

Qual é a sua bebida favorita?

Alex Turner: Tem o Bourbon, chamado Bulleit.

Aah, sei. Esse é realmente muito bom. Não tenho me deparado com muitas pessoas que o conhecem.

AT: Você disse que veio (de avião) de Nashville?

Bem, nós dirigimos, na verdade.

AT: É… Provavelmente tenho dirigido mais nos Estados Unidos do que eu já dirigi na Inglaterra, na realidade. Dessa vez, ano passado, eu fiz o velho PCH (aluguel de automóveis) pela costa e depois dirigi de volta para Joshua Tree (deserto), também. De certa forma, senti como se aqui fosse mais fácil ou algo assim. Talvez por causa das pessoas que não ficam se lamentando tanto com isso. [Risadas] Pois as coisas são mais de boa por aqui.

Você escreveu essas músicas para o mais novo disco depois de se mudar pro Brooklyn?

AT: Não. Mas escrevi um monte desde que me mudei pra cá.

Um monte de compositores tem uma vida bem efusiva por detrás de sua escrita, uma vez que deixam seu país materno… É como se eles pudessem escrever com um olhar mais claro sobre as coisas. Robert Frost, por exemplo… sua escrita de fato tomou corpo quando ele se mudou com sua família para o Reino Unido. Você já experimentou qualquer coisa assim?

AT: Sim. Acho que se mudar pra lá parece ter me dado um tipo de chute no traseiro, ou algo assim. Quer dizer, é bem provável que me sentarei lá, mais frequentemente do que eu fazia, e escreverei. Sinto que há mais um monte de cômodos aqui, e tal. Mas na verdade, as músicas deste disco vieram todas antes [que me mudei]. Mas, o próximo disco provavelmente será de todas essas músicas (que compõem atualmente), suponho.

Algum de vocês alguma vez, quando criança, quando ouviu uma música , pensou “Essa coisa ou ideia de música pop, eu a entendi. Eu deveria tentar fazer isso um dia?”

AT: Bem, eu me lembro, eu devia ter uns doze anos ou algo assim, e ouvir “I Am the Walrus” e pensar, “Bom, isso é meio sem sentido. Eu poderia escrever uma música como essa, com certeza.” E tentar escrever naquele estilo e realmente me empenhar. Eu me lembro distintamente de ficar irritado, porque tipo “Bom, ele ‘tá cantando sobre creme e uma espiga de milho sobre flocos de milho, e por que eu não consigo entender isso?” [Risos] E eu ainda não sei, exatamente.

Isso me lembra de quando eu vi Jackson Pollock pintando como uma criança e pensei, “Ah cara, esse cara fez todo mundo de bobo. Isso é uma coisa realmente muito fácil.” E então você fica um pouquinho mais velho e percebe que alguma coisa a mais está acontecendo ali.

AT: Exatamente. E tem outras coisas: me lembro de estar numa viagem de carro com meus pais e acho que aquela situação foi a primeira vez que eu ouviria música, quando criança. Eu acho que meu pai estava falando comigo sobre o som do Beach Boys e o aspecto da harmonia de suas músicas, também. Elas te evocam sensações—quase involuntariamente—e a ideia disto, foi algo que mexeu comigo, porque antes as letras ou algo nestas músicas, os acordes e as harmonias vocais, meio que te pegavam. Eu me lembro de ficar mexido, mesmo naquela idade. É quase como se você não pudesse evitar.

Absolutamente. Quando você começou a compor?

AT: Não durante algum tempo. Quando eu tinha ouvido os discos dos Beatles, como “Sgt. Pepper’s” ou qualquer outro, eu tinha meio que tentado escrever, mas não sabia como tocar um instrumento. Tive um pouquinho de aulas de piano, mas eu nunca aprendi—exceto as teclas brancas—sabe o que eu digo? [Risos] Eu nunca poderia sentar e descobrir alguma coisa. Mas assim que tive uma guitarra, eu descobri que você pode chegar nesse estágio mais rápido—onde você pode sentar e produzir coisas.

Quando você tentou escrever letras de música, você imaginou uma canção em termos de sílabas e ritmo—tipo, “OK, vou pôr essas palavras ou sílabas nesses lugares,” ou você não pensou muito nisso? Quanto você encaixa as palavras para uma melodia?

AT: Bem, eu acho que melodia é um pouco mais que de esforço pra mim. Quero dizer, este cara (acena para Matt) tem um senso realmente muito bom de melodia.

Matt Helders: Eu gosto de melodia.

AT: Ele conhece as melodias e onde as harmonias estão dentro de outras melodias  e…

MH: Às vezes eu gosto de uma batida um pouquinho brega. Quase sempre. Mas não tão é ruim. Como R&B.

AT: É, mas você vai propor que existem harmonias alternativas nas músicas…

MH: É…

AT: Quero dizer, mesmo quando estamos tentando cobrir uma música e selecionar as harmonias, acho difícil sintonizar a mim mesmo nisso. Estou tentando trabalhar nessa parte. Algumas pessoas são realmente muito boas nisso.

MH: Sim, como o (sotaque afetado) Casablancas.

AT: Sim, como Julian Casablancas. Ele é ótimo nisso. Quer dizer, há grandes letras naquelas músicas também. Mas, mesmo naquele disco solo novo, naquela música “11th Dimension”, a primeira coisa que me impressionou nela foi que o refrão—e bem quando você tá meio que indo numa direção, ele muda pra outro lugar. A forma que ele alterna…

MH: É como se ele tivesse ideias boas demais.

Sim. Essa é a coisa que amo naquele disco solo. Parece como ele tendo a chance de reunir todas essas ideias nesta única coisa, e nós temos a chance de ver um pouquinho melhor como seu cérebro de músico funciona.

AT: Sim. E eu sinto agora como seria bom para o próximo material deles. De certa forma, com aqueles tipos de melodias. Você gosta de The Strokes?

Demais.

AT: Sinto que escrever letras de música é um pouco diferente para cada caso, me parece. Às vezes, vou realmente terei uma ideia para uma música, como uma estória ou um formato. Como com a música “Cornerstone”, eu tive essa ideia que eu queria que cada verso tivesse o mesmo formato e depois você meio que sabia exatamente aonde ia, e o humor pode estar ali e faz disso uma coisa mais narrativa. Por outro lado, tem outras músicas onde eu ficarei empolgado pelo som de algo, foneticamente, e depois construirei sobre ele. Sabe como, “To pensando se eu poderia pegar essa e aquela palavra ali?” Certas coisas só ficam legais ao falar.

Você consegue achar a palavra “cuddle” (abraço) em muitas ótimas músicas de rock and roll.

AT: É, lamentavelmente. [Risos]

Ah não—isso é muito bom, eu acho, porque não soa fora de contexto. Quando você está compondo, você usa algum ponto de partida para ideia líricas, como uma cena de um filme ou um poema? Ou só desliga a TV ou iPod e tenta fazer uma expressão única?

AT: Sim, quero dizer, digamos que com essa mesma música [“Cornerstone”] tem um cara chamado Jack Thackray e ele escreve esses tipos de narrações, que são um tipo de humor. Em um de seus discos ao vivo, ele vai meio que parar para que as pessoas possam rir. Há um tipo de música assim chamada “Lah-Di-Dah” e é sobre todo tipo de incoerências: o que ele sente, pelo o que está passando, agora o que ele concorda com esta garota ali, que eles estão apaixonados e vão se casar. E depois, “E agora eu vou encontrar sua tia e acariciar o seu gato, e conversar com seu Pai sobre a guerra.” Em cada verso, ele meio que começa do mesmo jeito e descreve um diferente ângulo do verso. E esse tipo de destaque, pra mim, é na maneira com que “você” está sempre ali com ele. Eu acho que é um tipo de oposto a algo como “I Am the Walrus”. A forma que você entende completamente [cada detalhe] do que ele está escrevendo. Às vezes é difícil de fazer sem ser banal, suponho.

Parece que às vezes nas suas músicas tem uma narrativa muito clara do que está acontecendo—como em “Cornerstone”—e depois, outra vezes, certos detalhes poderiam ser mais claros, mas você está virando as costas para o público em alguns pontos principais, como em “Crying Lightning”. Parece que há esse tipo de interação entre, “I am laying it all out there for you” (“Estou colocando tudo para fora por você”) e depois em outro momento, “I am laying half of it out there for you” (“Estou colocando metade disso para fora por você”) e a obscuridade é o que torna interessante.

AT: Sinto que tem um pouco mais disso como um artifície neste álbum para nós—ainda tem uma espécie de um questionamento quando você está tocando no palco. Sinto que com essas músicas, eu quis quase que meio que deixar isso [questionamentos] um pouco de lado, então eu poderia tentar descobri-los durante o tempo que estaríamos tocando fora. Digo, você ainda quer ser o Walrus agora e depois. [Risos]

Sim, é difícil fazer bem mesmo uma vez, mas é mais raro na hora, eu acho, ouvir a música tipo-narrativa trabalhada ficar boa. Quando eu ouvi seu primeiro disco, eu imaginei, “Quem esses caras estão ouvindo?” Especificamente alguns compositores mais velhos, só por esse motivo. Tem ouvidos para estórias ali. Vocês ouvem muita música antiga?

AT: Definitivamente. Dentre as coisas que mencionamos sobre o crescimento—os Beach Boys ou Beatles ou mesmo as coisas do “Wall of Sound” que meus pais sempre teriam—penso que nós começamos a investigar e criar nossos próprios gostos, não muito antes de quando fizemos aquele primeiro disco. Quanto aos compositores que eu comecei a admirar—Elvis Costello, o Kinks, foram dois. Eu me lembro de quando a gente estava gravando o disco, tocando essa música—acho que foi tirado do ‘Face to Face’ [Kinks], chamada “It’s Too Much On My Mind”. Eu rio quando penso em mim carrancudo, quando com 17 ou 18 anos. [Risos] Mas sim, fomos sortudos demais por ter pessoas nas nossas vidas que nos viraram para Elvis Costello e mesmo The Smiths, entre outros. Como o cara que me ensinou a dirigir—eu ainda tinha seu álbum Hatfull of Hollow. Ele me emprestou. Ele estava muito viciado nele. Na verdade, eu o vi na outra semana. Nós tocamos em Sheffield e ele veio. Seu nome é Carl e ele ensinou todos os caras a dirigir. Ele nos ensinou a dirigir, mas realmente nos envolveu com os discos do The Smiths. Tínhamos gastado mais tempo falando sobre isso do que com a maldita manobra de 3 pontos (baliza).

Cara, que sorte. O cara que me ensinou a dirigir era amigo do meu pai, um veterano vietnamita, que tinha meia perna de pau. Nós não conversamos sobre o The Smiths. Já teve uma música ou um artista em particular que você ouviu e que te faz sentir que tinha uma espécie de segredo—onde você pensou que podia ter entendido o trabalho que ele pretendia, mais que apenas um ouvinte casual? Eu não me refiro a—“Eu sou um ouvinte de senso superior”—mas, mais do senso “Estou ouvindo um punhado de sutilezas aqui”.

AT: Quando estávamos na escola, senti tipo que a “nossa coisa” era esse cara chamado Roots Manuva, o rapper. Éramos viciado em hip hop no colegial, e esse cara Roots Manuva estava com seu segundo álbum. Ele contaria contos, bem detalhados, como o que ele contou sobre fumar um baseado no seu quintal e sair pro mercadinho da esquina; mas ele sempre tinha esse tipo de perspectiva distorcida, provavelmente do baseado, mas você sabe o que quero dizer. Ele descreveria sua cidadezinha, mas sempre um pouquinho à contra gosto. Então, acho que ele foi a primeira pessoa assim pra nós. Ele é engraçado. Na verdade, nós o encontramos algumas vezes. Ele acabou morando não muito longe de onde nós crescemos. Eu me lembro de encontrá-lo pela primeira vez neste festival uns anos atrás e ele passou a tarde e nos esbarramos com ele num bufê, ou algo assim. E ele tipo, “Bom, qual é o nome da sua banda?” e a gente “Bom, Arctic Monkeys, nós acabamos de tocar há algumas horas”. Ele disse, “Não têm mais macacos no Ártico”. [Rindo]

O outro cara que tinha uma espécie de percepção interessante, embora o contrário, na nossa banda foi John Cooper Clarke [poeta britânico]. Nós nos esbarramos com ele e ele gostou muito do nome da banda. Pois todo mundo costuma pensar que era apenas um nome idiota, sabe. Eu me lembro quando tivemos um empresário, e eles, “É, nós realmente gostamos do que vocês fazem, mas o nome não faz nenhum sentido, sabe? Não tem nenhuma conexão com o que vocês estão cantando…” E por um momento nós pensamos, “Não sabemos…” Depois Johnny Clarke diz [forte sotaque Lancashire afetado] “Oh, eu amei o nome daquela banda! É só uma imagem de trauma, sabe? Tem este macaco…”

MH: “E não tem árvores para ele subir…”.

AT: “E suas mãos estão frias demais para descascar sua banana.” [Rindo] E nós ficamos tipo, “Ótimo. Interessante, embora esse nome faça mais sentido para nós agora. Sinto que crescemos com ele. Agora, parece que tipo já estamos nos lixando ou de saco cheio, não sei.

Tipo dar nome a uma criança e eles poderem não gostar dele, mas eles crescem com ele. Tem uma história ótima de quando Picasso pintou o retrato de Gertrude Stein— e uma amiga sua disse, “Mas não parece em nada com ela”. Picasso respondeu, “Ah, mas vai”. [Rindo] Nomear uma banda é uma coisa difícil. Eu tenho alguns nomes que eu gostaria de passar pro John Cooper Clarke.

AT: Minha namorada (Alexa Chung, na época) disse que ela queria ter uma banda com nome “Cardboard Keyboard”. [Risos]

Se sua mão fosse forçada a escrever uma música da Madonna nesta noite, qual seria?

MH: Talvez uma nova dela seria divertido, ou uma do Austin Powers. Qual é? “Beautiful Stranger?” [Risos]

AT: Eu pensei numa com malha (de ginástica/dança), ou [canta] “Holiday”.

Nós temos isso em todas as entrevistas do “Drinks com…”, onde eu menciono alguns compositores mais mainstream, e pergunto a primeira coisa que vêm na cabeça—então, eu vou citar algumas pessoas e se você puder dizer o que vier na cabeça mesmo se for um ovo frito:

Joni Mitchell.

AT: Minha mãe tinha ‘Blue’. Eu me lembro de ver ele espalhado pela casa.

Bruce Springsteen.

AT: ‘Born to Run’. Ele estava no Glastonbury ano passado. Acho que eu vi ele no passado. Nós vimos, na verdade. Nossas mães fizeram…

MH: Ele estava hospedado no hotel perto da gente em Vienna, e nossas mães estavam lá. Havia centenas de pessoas do lado de fora do hotel dele. Eles o viram fugir e entrar num táxi e ninguém percebeu, apenas ele mesmo. E nossas mães ficaram tipo, “Acabamos de ver ele! Nós vimos Bruce Springsteen!”

Noel Gallagher.

Alex Turner e Matt Helders em uníssono: “Don’t Look Back in Anger”.

Vocês ouvem algum compositor mais velho, como Cole Porter? Tem uma inteligência em suas músicas, frases e rimas, que me faz lembrar das suas composições de seus discos.

AT: Meu Pai tem uma [fita] cassete do Frank Sinatra que ele tocava nas viagens de carro. Era pelos arranjos de Nelson Riddle do “I’ve Got You Under My Skin”. Eu me lembro da parte que meu pai batia nos meus joelhos, era quando Frank diz [imitando a voz de Frank] “Run for cover, run and hide”. Eu ouvi aquela fita bem pouco nas viagens de carro, na verdade, [canta] “They put coffee in the coffee in Brazil. You date a girl and find out later she smells just like a percolator…” [Ri] Nosso técnico de guitarra me transformou num peso por isso alguns anos atrás. Chet Baker fez um monte dessas músicas.

AT: Você gosta de música country?

Sim—alguns tipos mais que outros.

AT: Tenho evitado sempre [pausa e sorri] naturalmente. Mas eu ouvi essa música recentemente, de George Jones, eu acho, chamada “Relief is Just a Swallow Away” [canta] “Well I’ve been blue before and I will again, I’ll drown all my worries or I’ll teach ‘em how to swim, And I won’t be the one to pay because relief—Is just a swallow away…”

É uma ótima música. Eles tocam num clube particular em Nashville, de vez em quando entre os sets.

AT: É interessante pra mim, porque eu sei que nunca vou fazer um disco country…

Tem certeza?

MH: [Risadas] Poderia ser [voz profunda] “O disco que ele nunca vai fazer…”

AT: [Risos] É, certo. É isso que eu vou fazer agora. Você topa ou não topa?—Mas nesse momento parece tipo,  eu acho que nunca irei fazer algo que sequer soe country, eu posso ouvir essas músicas num tipo de distância ou forma diferente. É interessante.

Muito obrigado. Desculpa que, na verdade não pudemos encontrar nenhum drinque*.

AT: Talvez a gente consiga um pouco.


Por causa da segurança (etc.) do show naquela noite, nós tivemos que encontrar um lugar para conversar que tivesse uma porta dos fundos acessível a do teatro. Tinha uma ótima e curiosa lanchonete bem à esquerda do Riviera Theatre, em Chicago. Sem bebidas disponíveis, mas umas poucas pessoas idosas e algumas plantas na janela, com folhas de alumínio envolvendo os vasos. Depois que tínhamos conversado por um tempo, alguns dos clientes foram percebendo o fato de que Matt+Alex estavam sendo entrevistados por alguma coisa. Quando nos levantamos para ir embora, voltei para pegar a minha jaqueta e fui abordado por um senhor com um longo rabo de cavalo cinzento. Ele era um músico profissional nativo americano de flauta, e pediu que eu passasse suas informações adiante para o cavalheiro da entrevista. Naturalmente, eu o fiz, mas talvez o mais importante é eu ainda tenho seu cartão, se tiver alguém na área de Chicago, à procura.

Data: 12/03/2010


Fonte: American Songwriter

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